segunda-feira, 18 de março de 2013

A PRESCRIÇÃO NO CDME-PE


A prescritibilidade da pena de prisão na Lei 11817, de 24 de julho de 2000 (Código Disciplinar dos Militares do  Estado de Pernambuco)


Vilmarde Barbosa da Costa
Major da Polícia Militar de Pernambuco
Bel em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira
Pós graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Escola de Magistratura de Pernambuco
Pós graduado em Gestão Governamental pela Universidade de Pernambuco
Pós graduando em Ciências Criminais Militares pela  Faculdades Integradas Barros Melo

O tempo é uma instituição social, antes de ser um fenômeno físico. Indubitavelmente ele apresenta uma realidade objetiva, como é a sucessão do dia e da noite ou envelhecimento do ser humano. Mas, quer o apreendamos sob sua face objetiva ou subjetiva, o tempo é, inicialmente e antes de tudo, uma construção social – e logo, um desafio de poder, uma exigência ética e um objeto jurídico (NASSAR, 2009).
Assim, é necessária a compreensão dos fatos e atos jurídicos sob a ótica da temporalidade que permeia todas as relações de convivência humana, versando o decurso de tempo como fator de consolidação das relações jurídicas e de sua estabilidade (NASSAR, 2009).
Deste modo, o que se pretende é expor algumas considerações a respeito dos prazos contidos na lei 11817, de 24 de julho de 2000, e especialmente do instituto da prescrição, que no sentido técnico, significa a extinção da iniciativa de punir, resultado da inércia, durante certo lapso de tempo, do poder público na perseguição da infração ou na execução da sanção.
Assim, no que se refere a lei 11817, de 24 de julho de 2000, entre outros, observam-se a contemplação de prazos que tratam da parte disciplinar, da notificação do transgressor e do julgamento a ser proferido pela comandante, diretor ou chefe. Incide contudo, que todos estes prazos são meramente referenciais, tendo por finalidade evitar que os responsáveis se alonguem na adoção de providências elencadas na citada lei. Entrementes, em hipótese alguma, o não atendimento dos referidos prazos extinguem a punibilidade a ser aplicada ao militar estadual transgressor, visto que em momento algum o legislador nem expressa nem implicitamente deixou margem de interpretação neste sentido. Assim, mesmo ultrapassado os prazos previstos na lei em comento, pode a autoridade com competência para punir, atendido o devido processo legal, punir disciplinarmente o militar estadual.

Mas diante desta realidade surge uma pergunta: 1) O Comandante, Chefe e Diretor pode punir a qualquer tempo o militar estadual transgressor?

É induvidoso hodiernamente na doutrina e na jurisprudência que a regra no direito pátrio é da prescritibilidade, ressalvado a exceção prevista na Constituição Federal quanto a ação de ressarcimento ao erário. Entrementes, mesmo com tal premissa notória, o legislador pernambucano foi omisso no que diz respeito à prescritibilidade da pretensão punitiva no regramento disciplinar militar, não fazendo qualquer menção do referido instituto no diploma legal em tela.
Deste modo, e conforme visto, a regra adotada pelo constituinte federal é da prescritibilidade, portanto deve, ou pelo menos deveria, o legislador pernambucano ter incluído na lei 11817/2000, prazos que tratassem extinção da punibilidade disciplinar pelo decurso de tempo. Entretanto, mesmo diante da omissão legislativa, a constituição federal no caso ora em discussão não permite que a referida omissão seja interpretada em desfavor do administrado. Destarte, o comandante, diretor ou chefe não pode aplicar a pena de prisão a qualquer tempo.
Neste diapasão, entender que o Código Disciplinar do Estado de Pernambuco contemplou a tese que a pena de prisão pode ser aplicada a qualquer tempo é elevar o legislador estadual infraconstitucional a categoria superior a do constituinte federal, que de fato privilegiou a teoria da prescritibilidade.
A prescrição deriva diretamente do princípio da segurança jurídica, que rege os atos da administração pública. Na verdade, revela-se ofensivo ao referido princípio que um servidor, depois de 10 (dez), 15 (quinze) anos do cometimento do ilícito administrativo, esteja ainda sujeito a interminável e imprevisível expectativa de ser punido pela administração pública ( CARVALHO, 2011, P. 947). 
Conforme observou Paulin, qual seria a lógica de se conceder ao criminoso o direito de ver seus delitos prescreverem e se negar este mesmo direito a um administrado? É algo inconcebível. Desse modo, impõe-se asseverar que o administrado deve ter tratamento, por parte deste Estado, no mínimo, idêntico ao concedido ao delinqüente. Logo, se o Estado reconhece a prescritibilidade de delitos de caráter criminal, reconhece, com maior razão, a prescritibilidade de infrações administrativas (PAULIN, 2001, p. 74).

Entrementes, surge outro questionamento: se é prescritível, qual é o prazo máximo para a ocorrência da prescrição da punibilidade quanto a pena de prisão no Código Disciplinar dos Militares do Estado de Pernambuco?

Vejamos.
         O Decreto 3639, de 19 de agosto de 1975, que rege as situações de submissão da Praça com estabilidade, tanto da PMPE, como do CBMPE, a Conselho de Disciplina e o seu devido rito processual a ser observado na referida instrução, diz no artigo 17 que prescrevem em 6 (seis) anos, computados da data em que foram praticados, os casos previstos no diploma legal em apreço.
                 Assim, concluso o Conselho de Disciplina pela culpa do militar aconselhado, a pena a ser aplicada, obedecendo a devida proporcionalidade, será a de exclusão das fileiras da Corporação militar. A referida pena é a mais grave que uma praça pode receber no seio da Corporação. Deste modo, se a pena mais gravosa em virtude de uma infração administrativa pura prescreve em 06 (seis) anos, nenhuma outra pena disciplinar menos gravosa pode ultrapassar o tempo acima retromencionado.
Deste modo, 06 (seis) anos é o primeiro marco legal máximo para a aplicação de qualquer pena no âmbito das Corporações militares do Estado de Pernambuco.

Incide contudo que tal ilação nos conduz a outro interessante questionamento: se a pena de exclusão e prisão são de gravidades distintas, como poderiam ter o mesmo prazo prescricional?

Entendo que não é razoável nem proporcional adotar o mesmo tempo para todas as penas disciplinares. À guisa de exemplo, a lei 8112, de 11 de dezembro de 1990, traz prazos prescricionais distintos para os fatos punidos com suspensão e demissão.

Dispõe a Lei 8112, de 11 de dezembro de 1990,
Art.142 - A ação disciplinar prescreverá:
I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;
II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;
III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto a advertência.

Assim, se o decreto 3639/75, já prevê que para a pena mais grave que é de exclusão a prescrição ocorre em 06 (seis) anos, é cediço que homenagearíamos os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, a adoção de um prazo menor para o ocorrência de prescrição para a pena de prisão.

Contudo, surge inevitavelmente outro importante questionamento: qual seria o tempo e o diploma legal a ser observado?

  Vejamos,
Se existe uma lacuna, deve-se recorrer a uma lei análoga, conforme o estabelecido no art. 4º da Lei de Introdução ao Código Civil que dispõe: “quando a lei for omissa o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”.
Desta forma, e considerando que o Direito Administrativo adotou em diversas normas, como regra, o prazo máximo de prescrição de cinco anos, tanto em favor como contra a administração pública, reputo precioso o ensino de Hely Lopes Meirelles, que afimou que a prescrição administrativa depende de lei. Se esta não estiver estabelecida, é mister basear-se em outra, similar, que, segundo o autor, é o Decreto Federal nº 20.910/32, que em seu artigo 1º diz que as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
Neste diapasão, embora a lei fale de dívidas passivas dos entes políticos, e no caso especificado a lei fale de prazo prescricional em desfavor do administrado, observa-se que os tribunais vem aplicando o referido prazo quinquienal também contra a administração pública por imperativo do princípio da isonomia.

Assim já decidiu o STJ,

          O prazo para a cobrança da multa aplicada em virtude de infração administrativa ao meio ambiente é de cinco anos, nos termos do Decreto n.º 20.910/32, aplicável por isonomia por falta de regra específica para regular esse prazo prescricional ( Grifo nosso) (Resp 1115078 / RS, Rel Min. Castro Meira).

Além do princípio da igualdade, o instituto visa resguardar, com a sequencia do tempo, a estabilidade das situações jurídicas. Conta-se tempo igual para ambos (grifo nosso) (Resp 136204-RS, Rel. Min Vicente Cernicchiaro). 

E mais, 
Inexistindo regra própria para definir a prescrição da ação disciplinar da administração pública, objetivando apurar infração funcional, deve ser considerado o prazo geral para a prescrição administrativa, que é de 05 (cinco) anos (Resp 758386, Rel. Min. Francisco Peçanha).

Em síntese, inobstante a lei 11817/2000 (Código Disciplinar dos Militares  do Estado de Pernambucano), não contemplar prazo prescricional não significa que os comandantes, diretores e chefes possam a qualquer tempo punir aqueles que estão sob sua subordinação com a pena disciplinar de prisão. Como visto, por preceito constitucional, a regra é a da prescritibilidade.
E ainda.
A pena de exclusão para as infrações administrativas puras prescrevem em 06 (seis) anos, por fulcro no artigo 17 do decreto estadual 3639/1975. Assim, como a pena de exclusão prescreve no prazo acima referenciado, a pena de prisão que é menos grave, e por observância aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, deve prescrever em um prazo menor. Destarte, pelo fato do Código Disciplinar dos Militares do Estado não dispor de prazo prescricional para a pena de prisão, a nosso sentir, a Administração Pública deve adotar o prazo de 05 (cinco) anos, por ser este prazo regra no direito administrativo e estar contemplado nos principais ordenamentos juridicos do país e alicerçado na jurisprudência dos tribunais brasileiros. 

 
Referências bibliográficas

NASSAR, Elody. Prescrição na Administração Pública. Ed. São Paulo: Saraiva, 2009.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. Ed. Rio de Janeiro: Malheiros.
Paulin, Luiz Alfredo. Da Prescrição Administrativa em relação a infração cuja fiscalização cabe ao Banco Central do Brasil. In Revista de Direito Bancário do Mercado de Capitais e da Arbitragem. Ano 4, julho – setembro de 2001. 

NOGUEIRA, Nilza Pinto. Da Prescrição da Punibilidade no Processo Administrativo – O caso da Comisssão de Valores Mobiliários. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005.

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