segunda-feira, 11 de março de 2013

A REPREENSÃO NO CDME-PE E SUA INVIABILIDADE JURÍDICA



A Pena de Repreensão e sua inviabilidade prática perante os Militares Estaduais de Pernambuco (CDME)

CAP PMPE Demétrios Wagner Cavalcanti da Silva

Formação acadêmica (Cursos superiores)
* Curso de Formação de Oficiais ( APMP/PMPE - 2000)
* Bacharel em Direio ( Univ. Salgado de Oliveira, Recife - 2006)

Cursos complementares:
* Pós graduado em Direito Processual, pela Fac. Maurício de Nassau.
* Pós graduado em Direito Público, pela Escola Superior de Magistratura de PE.
* Gestão em Ensino, pela UFPE
* Gestão em Pessoas, pela FCAP/UPE
* Gestão em Segurança Pública, pela ACADEPOL

O Direito Administrativo, de forma mais apurada que outros ramos do direito, tem a Legalidade estrita como preceito fundamental de suas ações, seja em relação aos administrados, identificados hodiernamente como aqueles que se beneficiam da Administração Pública, seja em relação aos próprios servidores que formam a Administração Pública. Esse princípio, que foi originalmente descrito de forma genérica no Art. 5º, Inc. II, da Constituição Federal, foi finalmente delimitado no Art. 37, caput, da Carta Magna que aponta “A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]”, residindo aí a tal legalidade estrita. Vale, ainda, ressaltar que essa mesma Legalidade foi manifestada na Constituição Estadual de Pernambuco, que diz “Art. 97. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes do Estado e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, além dos relacionados nos artigos 37 e 38 da Constituição da República Federativa do Brasil e dos seguintes [...]”.

Em relação a atuação do Direito Administrativo em relação aos seus próprios servidores, é de se notar que entre seus preceitos o mais destacado é o Poder Disciplinar da Administração Pública, definido por Hely Lopes Meireles[1] como “ […] uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço ou do estabelecimento que passam a integrar definitiva ou transitoriamente[...]”.

O Poder Disciplinar carece de um harmônico corpo legal que viabilize a eficácia e celeridade de sua efetivação no caso concreto. É neste cenário primário que passamos a analisar o principal instituto normativo do Direito Disciplinar Administrativo dos Militares Estaduais de Pernambuco, a Lei 11.817/00, ou comumente chamado CDME - Código Disciplinar dos Militares Estaduais.

O CDME em seu 1º artigo define que “O Código Disciplinar dos Militares do Estado de Pernambuco tem por finalidade instituir o regime disciplinar dos militares estaduais, cabendo-lhe especificar e classificar as transgressões disciplinares militares, estabelecer normas relativas a amplitude e aplicação do penas disciplinares, classificar o comportamento das Praças, definir os recursos disciplinares e suas formas de interposição, além de regulamentar as recompensas especificadas no Estatuto dos Militares Estaduais”.( Grifos nossos)

Percebamos que o legislador estadual descreveu acertadamente que compete apenas a este instrumento legal, o CDME, delimitar as penas que podem ser impostas aos servidores militares estaduais, e isso foi feito no Art. 28:

Art. 28. As penas disciplinares militares a que estão sujeitos os militares estaduais, segundo o estabelecido na Parte Especial deste Código, são as seguintes:
I - repreensão;
II - detenção;
III - prisão;
IV - licenciamento a bem da disciplina; e
v - exclusão a bem da disciplina

Em seguida, ainda no mesmo artigo o legislador passou a descrever medidas administrativas – que não devem ser confundidas com as penas – estas que podem ser aplicadas cumulativamente ou substitutivamente às penas conforme o próprio legislador lecionou.

Há ainda um terceiro instituto, que não tem caráter punitivo, tão somente educativo e preventivo, que foi descrito no §3º do Art. 28 do CDME, in verbis:

§ 3º Precedente à aplicação de qualquer pena disciplinar ou medida administrativa, previstas nestes artigo, a autoridade competente poderá adotar o recurso da advertência, como orientação verbal ao transgressor, sem registro em sua ficha disciplinar, e poderá fixar-se unicamente nesta administração, quando se tratar da primeira penalidade aplicada no transgressor ou quando os antecedentes deste assim o recomendarem. ( Grifos nossos)

Logo, a advertência jamais poderá ser definida ou aplicada como pena pois ela não foi elencada como tal, antes como uma mero recurso de admoestação verbal. Por outro lado, é possível que essa admoestação dê causa à exclusão de punibilidade do servidor desde que seja utilizada na primeira transgressão da vida do militar estadual ou quando seus antecedentes recomendarem tal adoção, o que entendemos ser esta última hipótese excepcional enquanto que a primeira deva ser entendida como regra.

É de bom tom alertarmos uma inequívoca atecnia quando o legislado chamou essa admoestação de recurso, uma vez que a palavra “recurso” tem um caráter jurídico-processual e não o caráter jurídico-material como de fato é. Ou seja, recurso é um instrumento processual que visa combater uma decisão e no caso do CDME os recursos foram descritos no Art. 51 do CDME.

Fato é que não raras vezes temos visto Autoridades Administrativas aplicando a pena de repreensão, como meio até de pena alternativa, o que é um erro crasso.

Isso porque, assim como no Direito Penal, no Direito Administrativo Disciplinar existe o princípio da Anterioridade da previsão punitiva ( CF. Art. 5º “ XXXIX [...] nem pena sem prévia cominação legal), que entendemos ser temperada, ao que explicamos: se o legislador previu um “tipo administrativo” e para ela uma determinada pena, não pode o aplicador alterar a opção punitiva sob risco de estar cometendo Abuso de Autoridade uma vez que o ato é desprovido in totum da necessária legalidade. Assim, por exemplo, se o legislador previu no Art. 75 do CDME que utilizar-se do anonimato para qualquer fim condiciona uma pena de Prisão, independente do quantum dela, não pode o aplicador optar por mudá-la, podendo apenas inferir as atenuante ou agravantes para aproximar o quantum da pena para o máximo ( se agravantes) ou mínimo ( se atenuantes), mas nunca além ou aquém do limite que o legislador previu e muito menos mudando a própria sanção.

Fazendo um breve resumo do que acima foi esposado, esclarecemos que pelo infirmado não é possível que uma pena substitua outra pena, sendo possível apenas que uma medida administrativa substitua uma pena. Há ainda é verdade, a Advertência Verbal, mas esta nem sequer pode ser observada como pena ou medida administrativa, visto que é uma mera causa de exclusão de punibilidade.

Por fim, não obstante a impossibilidade da mutação de pena, é de se perceber que embora previsto no Art. 28, inc. I, a pena de Repreensão não foi atrelada a qualquer tipo punitivo, pelo que resta-nos inequivocamente afirmar que a Repreensão é uma “pena morta”, uma verdadeira aberração punitiva, uma alma vadia sem um corpo para se apoderar e acontecer no mundo físico e real, sendo aí manifesta sua inviabilidade prática e inócua previsão legal.




[1]          MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2007. P.124.

Um comentário:

Cap PM Demétrios Wagner CAVALCANTI da Silva disse...

Nenhuma sanção ( seja ela pena ou medida administrativa) pode ser apicada sem previsão legal.
Quando tratamos do tema legalidade, na Administração Pública, vemos que:

“Na Administração Pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa “pode fazer assim”; para o administrador público “deve fazer assim”.(grifo nosso)” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2004, página 88)

Assim não é possível que a Administração Pública, na pessoa de seus Comandantes, tomem qualquer posicionamento sem que haja uma expressa previsão legal do ato.
Assim, uma vez que a aplicação se "serviço extra" ( nos termos do CDMEPE, prestação compulsória de serviço) é uma medida administrativa, resta seguir aquilo que foi previsto pelo CDMEPE, ou seja, aplicar alternativamente para as transgressões leves e cumulativamente para as transgressões médias e graves. Se um determinada prática , por mais ignóbil que seja, não seja prevista na Lei 11817 como transgressão, não será possível aplicar-lhe uma medida alternativa. Ou seja, não é possível no modelo adotado pelo legislador pernambucano haver "medidas alternativas autônomas".
Por outro lado, voltando ao início do coerente apontamento, ora esmiuçado, esclareço que em breve será publicado um artigo neste blog tratando sobre as repercussões administrativas dos crimes militares praticados por PPPMM. Não é todo correto entender que porque determinado fato é crime, não haverá repercussão administrativa ( in casu, não é porque há o crime de dormir em serviço, que não será possível observar tal feito na esfera administrativa). Observe o que diz o Art. 2º do Decreto nº 3639/75 que abre pacífico entendimento de que, uma vez denunciado pelo MPPE, pode sim o militar responder na seara administrativa, mas não por uma Parte disciplinar ou sindicância, mas mediante um Conselho de Disciplina, que por sua feita poderá aplicar-lhe, se assim for necessário, a pena administrativa capital, a exclusão/licenciamento/demissão.
Espero ter atendido aos questionamentos, ao tempo que me coloco à inteira disposição para maiores detalhes.
Atenciosamente,

Cap PM Demétrios Wagner CAVALCANTI da Silva
Membro da 4ª CPDPM / Cor. Ger. SDS

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